Simples Nacional ou débito e crédito de IBS/CBS? Como a farmácia deve decidir na Reforma Tributária

Com a Reforma Tributária e a criação do IBS e da CBS, as farmácias terão, pela primeira vez, a opção de permanecer no Simples Nacional ou migrar para o regime de débito e crédito.

Essa escolha impacta diretamente o custo de compra, a margem bruta, o preço final ao consumidor, a competitividade frente às grandes redes, o relacionamento com distribuidores e indústrias e o fluxo de caixa.

Este artigo explica como tomar essa decisão com segurança, com base em cálculos, indicadores, exemplos e estratégias para farmácias de diferentes portes.

1. O que muda com a Reforma Tributária?

A partir de 2027 o Simples Nacional continuará existindo, mas com uma estrutura atualizada. A alíquota única da farmácia passa a incluir ICMS, ISS, IBS e CBS, além dos tributos federais já conhecidos.

Ao mesmo tempo, a Lei Complementar nº 214/2025 permite que o optante do Simples escolha recolher o IBS e a CBS pelo regime regular, também chamado de regime de débito e crédito.

A base legal está no artigo 13, parágrafo 10 da Lei Complementar nº 123, com redação dada pela Lei Complementar nº 214/2025:

“É facultado ao optante pelo Simples Nacional apurar e recolher o IBS e a CBS de acordo com o regime regular aplicável a esses tributos.”

Na prática:

  • a farmácia continua no Simples para IRPJ, CSLL, INSS e demais tributos;
  • mas sai do Simples somente para IBS e CBS, passando a usar o modelo normal de débito e crédito.

2. O que significa “regime regular” para uma farmácia?

No regime regular a lógica tributária muda. A farmácia passa a:

  • destacar IBS e CBS na venda;
  • tomar crédito de IBS e CBS na compra;
  • recolher a diferença entre débito e crédito;
  • participar do split payment quando esse modelo estiver em vigor.

Em termos práticos, o sistema se aproxima do funcionamento do ICMS atual, mas com características distintas:

  • base mais ampla;
  • maior neutralidade;
  • fim da substituição tributária;
  • regras mais lineares e matemáticas.

3. Quando faz sentido ficar no Simples Nacional (sem crédito)?

A permanência no Simples Nacional tende a fazer mais sentido para farmácias que se enquadram em alguns cenários.

Primeiro, quando a margem bruta depende mais do preço de venda do que do crédito tributário. Esse é o caso de farmácias que vendem muitos itens com baixa tributação futura, alta margem, mix forte em cosméticos, higiene e perfumaria e ticket médio baixo. Nesses casos, o Simples ainda tende a ser competitivo.

Segundo, quando o faturamento está abaixo de cerca de R$ 1,5 milhão por ano. Nessa faixa, as alíquotas do Simples ficam entre 4% e 8% sobre o faturamento e, mesmo sem crédito de IBS e CBS, o regime continua vantajoso.

Terceiro, quando a compra é majoritariamente feita via distribuidores, com pouca recuperação de crédito. Muitas pequenas farmácias compram entre 80% e 100% de distribuidores, com pouco poder de negociação e preços já líquidos de descontos. O benefício do crédito de IBS e CBS é menor nesse perfil.

Quarto, quando o custo de conformidade e de sistemas é alto para adotar o regime de débito e crédito. O regime regular exige ERP robusto, conciliação tributária, conferência de crédito, integração com split payment, controle de notas fiscais eletrônicas e uma estrutura fiscal mais forte. Pequenas farmácias podem não ter essa estrutura.

4. Quando vale migrar para débito e crédito de IBS/CBS?

Do outro lado, há situações em que migrar para débito e crédito deixa de ser opção e passa a ser estratégia de sobrevivência competitiva.

Primeiro, quando a farmácia compra muitos produtos de alta tributação, como cosméticos, dermocosméticos, perfumaria, vitaminas e suplementos. Esses produtos hoje suportam ICMS entre 18% e 25% e PIS e COFINS de 3,65% ou 9,25%. No cenário de IBS e CBS, a carga total para muitos desses itens ficará próxima de 25%.

Com o regime de débito e crédito, a farmácia recupera integralmente esse imposto nas compras. No Simples, não recupera nada. Esse é o maior ponto de perda de competitividade.

Segundo, quando a farmácia compra muito direto da indústria. Nesse caso, a empresa terá crédito cheio de IBS e CBS, sem substituição tributária, sem antecipação e sem travas. O ganho pode ser significativo.

Terceiro, quando a concorrência direta é formada por redes que estarão no regime de débito e crédito. Grandes redes como Raia, Drogasil, Pague Menos, São João, DPSP e Panvel tendem a migrar para o débito e crédito. Se a pequena ou média farmácia permanecer no Simples:

  • o preço de venda fica artificialmente mais alto;
  • a competitividade cai rapidamente;
  • a posição em PMVG ou PMC se deteriora;
  • a margem fica pressionada.

Quarto, quando o impacto do crédito de IBS e CBS supera o benefício do Simples.

Considere o exemplo:

  • a farmácia compra R$ 100.000 por mês em mercadorias;
  • 60% desse valor corresponde a produtos com carga futura de 25%;
  • o crédito potencial é de 25% sobre R$ 60.000, ou seja, R$ 15.000 por mês.

No Simples, a farmácia paga uma alíquota média de 8% sobre um faturamento de R$ 150.000, o que resulta em R$ 12.000 por mês.

A comparação é direta:

  • perde R$ 15.000 de crédito;
  • paga R$ 12.000 de Simples;
  • acumula desvantagem total de R$ 27.000 por mês.

Para farmácias com mix muito forte em cosméticos e dermocosméticos, o Simples se torna altamente desvantajoso nesse cenário.

5. Indicadores práticos para tomar decisão

Uma forma simples de organizar a análise é usar uma matriz de decisão que compare o Simples e o regime de débito e crédito em alguns critérios centrais.

Matriz de decisão

Critério Simples Débito e crédito
Mix cosmético e perfumaria alto Desfavorável Muito favorável
Compra direta da indústria Desfavorável Muito favorável
Faturamento acima de R$ 2 milhões por ano Desfavorável Favorável
Margem muito apertada Desfavorável Muito favorável
Falta de estrutura fiscal Muito favorável Desfavorável
Mix de medicamentos essenciais regulados pela CMED Muito favorável Desfavorável
Grande compra atual com MVA ou substituição tributária Simples compensa Regime regular muda tudo

Quanto mais critérios indicarem vantagem para o regime regular, mais forte é o sinal de que faz sentido migrar.

6. Checklist definitivo: como decidir?

Para tornar a decisão menos subjetiva, a farmácia pode seguir um roteiro objetivo.

Primeiro, calcular a alíquota efetiva do Simples com base na receita bruta dos últimos doze meses. Isso inclui a soma de IRPJ, CSLL, CPP, ICMS, IBS e CBS embutidos na alíquota.

Em seguida, comparar essa alíquota com a carga futura de IBS e CBS no regime regular.

Depois, simular o crédito potencial de IBS e CBS nas compras, por fornecedor, NCM, mix e volume.

Também é essencial comparar o impacto no capital de giro. No split payment a farmácia não retém o imposto, o que modifica o fluxo financeiro.

Outro ponto é observar como os principais concorrentes vão operar. Redes em débito e crédito mudam o patamar de preço e de margem na região.

Por fim, o ideal é simular os dois cenários por um período de doze meses, projetando faturamento, compras, créditos e carga total. A partir desses números, a decisão tende a ficar bem mais clara.

7. Conclusão estratégica

De forma geral, farmácias pequenas tendem a permanecer no Simples, enquanto farmácias médias e grandes tendem a migrar para o regime de débito e crédito de IBS e CBS.

O divisor de águas é o mix de produtos. Quanto mais forte for a presença de itens de dermocosméticos, beleza e perfumaria, mais o regime de débito e crédito se torna praticamente obrigatório.

Já farmácias com mix mais concentrado em medicamentos essenciais regulados pela CMED tendem a manter o Simples como regime preferencial, desde que a conta global de carga e créditos confirme essa escolha.

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