Constituição crédito fundo compensação ICMS: quando a Receita converte erro em dívida da União

O Art. 395 da Lei Complementar nº 214/2025 trata da etapa mais rigorosa do Fundo de Compensação dos Benefícios Fiscais do ICMS. Ele define quando a Receita Federal pode constituir um crédito da União contra o contribuinte que recebeu valores indevidamente e não regularizou sua situação.

É a fase em que o erro vira dívida, com multa, juros e risco imediato de inscrição em dívida ativa. A seguir, explico como funciona esse mecanismo e seus impactos para empresas beneficiárias de incentivos estaduais.

1. Quando a Receita constitui o crédito da União

O caput do Art. 395 estabelece três situações principais que autorizam a Receita Federal a constituir o crédito tributário relacionado ao Fundo de Compensação.

Gatilho 1 — Regra do Art. 393, §5º: ocorre quando o contribuinte recebeu crédito indevido, retificou a escrituração, não devolveu o valor e a compensação automática não foi suficiente ou deixou de gerar créditos por três meses consecutivos.

Gatilho 2 — Irregularidade identificada após o pagamento: mesmo após o crédito ter sido pago, a Receita poderá revisar a operação e constatar irregularidade, exigindo devolução.

Gatilho 3 — Descumprimento do prazo de devolução: caso o contribuinte seja notificado para devolver valores em trinta dias e não cumpra, a Receita poderá constituir o crédito imediatamente.

2. O que compõe o crédito da União

O Art. 395 define três elementos que compõem o crédito:

I — Valor principal: o valor indevido recebido pelo contribuinte.

II — Juros de mora: calculados pela Selic acumulada desde o mês subsequente ao recebimento indevido até o mês anterior à notificação.

III — Multa de 20%: a multa incide sobre principal e juros, representando uma penalidade significativa.

3. Prazo para a Receita constituir o crédito

O §1º estabelece que a Receita Federal possui três anos contados do primeiro dia do exercício seguinte ao do recebimento indevido para constituir o crédito.

No entanto, se houver retificação conforme o Art. 393, §6º, o prazo passa a contar da data da retificação, reiniciando a janela de fiscalização.

4. Juros após a constituição do crédito

O §2º determina que, após a constituição do crédito, continuam a incidir juros pela Selic acumulada, acrescidos de um ponto percentual no mês do pagamento.

Isso torna custosa a postergação do pagamento e reforça a necessidade de regularização imediata.

5. Notificação é suficiente para inscrição em dívida ativa

O §3º afirma que a notificação da constituição do crédito é instrumento apto para inscrição em dívida ativa da União.

Isso significa que o débito poderá ser inscrito rapidamente, sem necessidade de etapas adicionais, levando à cobrança judicial e a medidas como bloqueios, penhoras e restrições fiscais.

6. Processo administrativo e limites da defesa

O §4º assegura o direito de recurso administrativo, com prazo de trinta dias. O §5º esclarece que o recurso não suspende automaticamente o pagamento.

Assim, o contribuinte pode recorrer enquanto enfrenta cobrança ativa e compensações de ofício, situação que exige controle rígido das obrigações fiscais.

7. Compensação de ofício após constituição do crédito

A Receita poderá reter créditos futuros do Fundo para compensar o valor devido, reduzindo o montante líquido recebido pela empresa e impactando o fluxo de caixa.

8. Efeitos do recurso quando o contribuinte vence

Se o contribuinte vencer o recurso, o §9º determina que o crédito será cancelado ou reduzido e eventuais valores compensados indevidamente deverão ser devolvidos com juros da Selic.

9. Destinação dos valores arrecadados

Até 31/12/2032, o valor principal e os juros vão para o Fundo de Compensação do ICMS. Após essa data, passam para o Fundo do Art. 159-A da Constituição.

A multa de 20% vai para o FUNDAF, fundo destinado a financiar atividades de fiscalização da Receita Federal.

10. Conclusão

O Art. 395 estabelece o mecanismo mais rigoroso da compensação dos benefícios fiscais de ICMS. Quando ocorre a constituição do crédito, o contribuinte enfrenta multa, juros, possibilidade de inscrição imediata em dívida ativa e compensação de ofício com créditos futuros.

Empresas que utilizam benefícios fiscais estaduais precisam se preparar para as exigências desse regime, estruturando controles sólidos e revisões constantes para evitar impactos financeiros significativos.

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